quinta-feira, dezembro 21, 2006

UMA VISÃO ECOLÓGICA DO TRABALHO E DA “MAIS VALIA

Focalizaremos o trabalhador e as relações de trabalho e o objeto trabalhado, do ponto de vista ecológico, apoiados em Pierre Aguesse que afirma:

“A par da sua concepção clássica, a ecologia deve "incluir o Homo Sapiens e suas atividades", pois "a ecologia não é mais apenas a ciência do naturalista, de vez que disciplinas tão variadas como o direito, a economia, a sociologia, etc. devem estar incluídas no seu campo de investigação", resultando em verdadeira ciência o homem e que, para Bougley, “a ecologia "antes era disciplina um tanto difusa e incoordenada que lutava para abarcar estudos como a fisiologia, a genética e a evolução".

Com suporte no trecho supra, podemos considerar as atividades laborativas como relações ecológicas (um aspecto da ecologia humana), pois se trata de uma ação do ser humano sobre o ambiente e/ou sobre outros sistemas situados no ambiente, inclusive outros sistemas humanos (como nas ações de saúde), afetando-se reciprocamente, as quais podem ser traduzidas como conjunto de relações de intercâmbios de “matéria, energia e informações”, entre os sistema e, destes com o seu entorno.

Nesta acepção, a “mais valia”, corresponde à apropriação de parte da energia do corpo do trabalhador que se transfere para o objeto trabalhado e que não é compensada pelo equivalente energético contido no salário que lhe é pago.

Em inadequadas condições de trabalho e de alimentação, a transferência de energia pode ocorrer até às expensas da massa corpórea do trabalhador, transformando-se em verdadeira transferência de matéria do próprio corpo do trabalhador para o objeto produzido, vale dizer, para quem dele se apropriar.

Através desta ótica, examinemos mais um trecho da publicação da Revista Filosofia, Ciência & Vida:

“O produto, de propriedade do capitalista, é um valor-de-uso, fios, calçados etc. Mas, embora os calçados sejam úteis à marcha da sociedade e nosso capitalista seja um decidido progressista, não fabrica sapatos por paixão aos sapatos. Na produção de mercadorias nosso capitalista não é movido por puro valor-de-uso. Produz valores-de-uso por serem e enquanto forem substrato material, detentores de valor de troca. Tem dois objetivos. Primeiro, quer produzir um valor de uso, mas que tenha um valor de troca, um artigo destinado à venda, uma mercadoria de valor mais elevado que o valor conjunto das mercadorias necessárias para produzi-la, isto é, a soma dos valores dos meios de produção e força de trabalho pelos quais antecipou o seu bom dinheiro no mercado. Além de um valor de uso, quer produzir mercadoria, além de valor de uso, valor e não só valor, mas também valor excedente (mais valia).”

Passaremos a tratar do trecho acima, do trabalho do jornalista Marcelo Galli, sob o ponto de vista da entropia e do seu par antagônicom a negentropia.

A capacidade que tem o homem de atuar e transformar seu ambiente constitui trabalho.

O trabalho, tanto muscular como intelectual, correspondem a um aspecto do movimento da "matéria, energia e informações" e constitui a base de toda atividade econômica.

A Termodinâmica estuda a energia, sua transferência e condução, bem como os efeitos destes processos em um sistema determinado e no seu ambiente.

A energia do universo tende a se distribuir no sentido de um maior nivelamento, em sua forma mais degradada, anárquica, caótica, indiferenciada, equilibrada e mais estável possível, designando-se esta característica com o nome de entropia.

O termo entropia foi criado por Clausius3 (l850), estribado no segundo princípio da Termodinâmica, para denotar a tendência universal de todos os sistemas para atingir estados de maior degradação: catamorfose, indiferenciação, um direcionamento para baixo (resfriamento, nivelamento energético, desorganização, mesmice, caos), enfim, para a “morte entrópica”, incluindo a morte dos sistemas vivos.

Mario Chaves diz que Gibbs formulou a teoria de que essa probabilidade tende naturalmente a aumentar acompanhando o envelhecimento do Universo.

Em razão dessa tendência de aumento contínuo e permanente da entropia, pode se afirmar que o estado mais provável do planeta Terra é o seu total resfriamento, assim como já aconteceu com Marte, cujo estado atual é um exemplo patente dos efeitos da ação da entropia, desenvolvida há bilhões de anos, o qual, um dia, pode ter apresentado as condições climáticas semelhantes às existentes, hoje, na Terra.

Entropia é a medida da perda das características que fazem com que um sistema se diferencie do seu ambiente.

“Entropía es el grado de desorden, el equilibrio máximo en el cual no se puede haber cambios físicos ni químicos, ni se pude desarrollar ningún trabajo y donde la presión, la temperatura y la concentración son uniformes e irreversibles en todo el sistema. Solo los sistemas en desequilibrio pueden desarrollar trabajo.” (Cesarman, E. - Hombre y Entropia - Editorial Pax - México S/A - Primera Edición - México - DF - 1974.)

O estado mais provável da vida é a morte e, a situação mais provável da administração é o caos.

A fim de se opor, temporariamente, à ação inexorável da entropia, o homem tem a necessidade de aplicação, contínua e permanentemente, de forças antientrópicos (negentropia), tanto com relação à vida e a saúde, como no que tange aos processos administrativos e às máquinas e, mesmo, ao próprio sistema social global.

A Negentropia, cujos sinônimos são: anatropia, neg-entropia ou neguentropia (entropia negativa = entropia com o sinal invertido), contra-entropia, antientropia, ou ainda, entalpia, significa o movimento da energia no sentido de mais informação, mais organização, mais vida, mais saúde, mais progresso, mais complexificação, de um determinado sistema.

Negentropia é uma expressão apta a representar a síntese de todas as modalidades de energia, conhecidas ou desconhecidas, a qual teria ela presidido a organização da matéria e sua evolução “desde o mineral até a consciência”, na feliz expressão de Pierre Teilhard Chardin.

Com base na lei de transformação da energia (uma modalidade desta pode ser transformada em outra), podemos, operacionalmente - para os fins deste trabalho - considerar a Negentropia como um elemento unificador (síntese) de todas as espécies de energia, conhecidas ou não.

A vida constitui uma contra corrente à lei geral da entropia, existindo um conflito permanente entre o ser vivo e o ambiente que vive, entendido o sistema ambiental como o somatório de seus quatro componentes: um subsistema físico, um subsistema biológico, um subsistema social e um subsistema tecnológico.

A origem da vida, a construção do código genético, os mecanismos da reprodução, todo o processo evolucionário, a diferenciação das espécies, a manutenção do equilíbrio dos organismos vivos (homeostasia), a aquisição dos mecanismos da consciência e da linguagem, se teriam sido direcionados pelas próprias potencialidades ou “virtuosidades da matéria”, como preconizam uns autores (materialistas) ou por uma grande consciência, preexistente, como propugnam outros (idealistas), cuja controvérsia (e esta é a questão fundamental da filosofia), não pretendemos, aqui, discutir, entretanto, esta questão poderia ser traduzida pela metáfora expressa na pergunta: “Qual teria surgido primeiro, o ovo ou a galinha?”.

Todavia, se a organização da matéria como o surgimento da vida, tenha sido resultado de potencialidades ou virtuosidades intrínsecas da matéria e, inscritas no seu próprio âmago, como preconiza Engels ou, decorrentes da vontade e ações de uma consciência superior e transcendental, como postulam outros, poderíamos, pelo menos com objetivos operacionais (e o fazemos neste trabalho), atribuir a designação de Negentropia a essa “força” ou energia, a esse princípio ou poder organizador, seja de natureza endógena ou exógena, seja intrínseco ou extrínseco, em relação à matéria.

“El trabajo ocasiona una transferencia de la entropía negativa del organismo humano hacia el objeto que este elabora con dicho trabajo. La desintegración que el trabajo ocasiona en el ser humano se traduce por la integración de un objeto. A su vez, el trabajo del hombre también ocasiona una desintegración de la naturaleza. Sin embargo, con este trabajo que lo desintegra y entropiza, el hombre integra y disminuye la entropía del sistema-sociedad. Se trata de un concepto elemental e fundamental que no hay que olvidar. El trabajo es tan solo una transferencia de entropía negativa.” (Cesarman, E.).

A capacidade que tem o homem de atuar e transformar seu próprio sistema ou seu ambiente constitui trabalho.

O trabalho, tanto muscular como intelectual, correspondem ao movimento da matéria, energia e informações e constitui a base de toda atividade econômica.

Há uma constante transferência de entropia de um sistema para outro ou para o ambiente e vice versa.

O ser humano, igualmente a qualquer sistema biológico, sofre um desgaste ou deterioração ao transformar energia em trabalho, ocasionando, pois um aumento da entropia em seu organismo.

O homem, ao atuar sobre a matéria, a fim de transformá-la em objeto, acrescenta-lhe negentropia, diminuindo a entropia deste, enquanto a negentropia do corpo do trabalhador fica diminuída, em razão da transferência para o objeto trabalhado e, conseqüentemente, a entropia do seu organismo torna-se aumentada.

Quando nem o equivalente da negentropia, despendido pelo corpo do trabalhador for reposto, mediante o salário recebido, se caracteriza a mais expressiva autêntica forma de “mais valia”.

Se o estado entrópico, decorrente do trabalho, não for neutralizado, mediante a reposição de negentropia, ou entropia negativa, resultante será pobreza, miséria, doença e morte.

A transferência de entropia negativa (negentropia) do próprio corpo do trabalhador para o objeto ou sistema trabalhado, torna estes menos entrópicos, enquanto o trabalhador fica mais entrópico, “entropiado” ou estropiado.

O salário percebido pelo trabalhador corresponderia a uma porção de negentropia (entropia negativa), paga pelo empregador ao trabalhador em contra-partida à entropia, produzida no corpo do trabalhador em decorrência do trabalho realizado.

No ato da execução de um trabalho, ocorre um aumento de entropia do organismo humano, face à transferência de negentropia ou entropia negativa do corpo do trabalhador para o objeto elaborado, o qual tem sua entropia diminuída e a sua negentropia aumentada.

"Durante el proceso de trabajo aumenta el caos y el desorden en el sistema del organismo humano (al perder energía) y aumenta el orden y la diferenciación del sistema que recibe dicho trabajo. El hombre, al fabricar un bien, sea una maquina o un objeto, crea un sistema integrado a expensas de la desintegración del propio sistema.” (Cesarman, E.)

Uma parte do salário que o trabalhador recebe é tão somente para compensar a entropia produzida em seu próprio corpo pela transferência de energia (ou negentropia) deste para o objeto de trabalho, ficando “elas por elas”. Por isto, o trabalhador necessita como retribuição pelo seu trabalho, algo mais que a simples reposição da energia despendida, inclusive para atendimento de outras necessidades, como o sustento de sua família.

"El ser humano al trabajar pone en peligro su poca probabilidad como sistema y su desequilibrio y inestabilidad en relación al medio ambiente. Se trata de un punto de vista más de la enajenación de ser humano: el de la transferencia de entropía negativa. La actividad económica de ser humano es una transferencia de entropía negativa. Este enajena su orden estructural y su integridad energética, para integrar bienes y proporcionar servicios. Al mantenerse integrado a su familia y a su sociedad y al incorporar a ellas bienes de todos os tipos, el hombre lo paga con el precio de su entropía negativa”. (Cesarman, E.).

Acima se encontra a referência a um processo de alienação do trabalhador em relação ao produto do seu trabalho, o qual cede sua própria integridade estrutural e energética, que passa a integrar os bens ou serviços por ele produzidos, para os quais transfere a negentropia - ou entropia negativa - do seu próprio corpo, tornando-se mais entrópico.

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