quinta-feira, novembro 27, 2008

De onde governos tiram recursos para salvar bancos?

Pedro do Coutto (Tribuna da Imprensa)

O título deste artigo, creio, reflete uma pergunta fascinante pelo enigma que ela traduz. Impressionante como existe tanto dinheiro (no mundo) para salvar bancos em crise e como falta este mesmo dinheiro para setores vitais, como a saúde, educação, segurança, habitação, transporte. O problema, inclusive, não é só brasileiro. Com a crise do subprime, que deixou um rombo enorme de dimensão universal, o problema generalizou-se de forma impressionante.

Na primeira página da edição do dia 25, a "Folha de S. Paulo" chama para a matéria do correspondente em Nova York, Sergio Dávila. Ele revela que, além dos 20 bilhões liberados agora de emergência para o Citigroup, o Tesouro dos Estados Unidos prepara-se para assumir 306 bilhões de dólares para ancorar ativos submersos do mesmo grupo econômico, que continua sendo o mais poderoso de todos. Entretanto, a operação de socorro não termina neste ponto, acrescenta o jornalista. Não.

Ele publica um quadro que reúne o mesmo Citibank, mais o Morgan Chase, o Bank of America, a seguradora AIG, o Goldman Sachs, a Merryl Lynch, além de outro Morgan, este o Morgan Stanley. Montante já destinado a todos estes, como num passe de mágica: 300 bilhões de dólares. Praticamente o montante que vai ser injetado adicionalmente no Citigroup. De onde sai tanto dinheiro? Afinal de contas, o poder público não produz receita diretamente, mas, isso sim, é um instrumento de riqueza através do processo de desenvolvimento.

Qual a explicação? No mundo, calcula Dávila, o desequilíbrio causado pelo subprime, na realidade uma superbomba financeira, oscila em torno de 5 trilhões de dólares. Cinco trilhões de dólares representam um terço do Produto Interno Bruto dos Estados Unidos. Ou dez por cento do Produto Mundial, que se situa na faixa de 45 trilhões a 50 trilhões de dólares. Uma explosão fantástica que atingiu o sistema financeiro e a economia mundial. Vai, sem dúvida, gerar efeitos em cadeia.

O governo Lula, diretamente através do Ministério da Fazenda, ou indiretamente por intermédio do Banco Central, tem partido ao encontro de uma série de instituições em crise. Além de ter injetado dezenas de bilhões de dólares no mercado para segurar a cotação da moeda estrangeira dentro do País, agora há pouco tornaram-se mais elásticos os prazos de recolhimento de impostos federais.

Realizou financiamentos a bancos ameaçados, adquiriu o Nossa Caixa de São Paulo, editou medida provisória, que está para ser votada talvez esta semana (escrevo este texto terça-feira) autorizando o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal a assumirem participações em bancos ou estabelecimentos em crise.

Enfim, como se verifica, uma bem ampla distribuição de recursos. São para conter riscos, afirmar-se. Tudo bem. Mas de onde vem tanta disponibilidade? Lendo-se o balanço financeiro da Secretaria do Tesouro Nacional, assinado por Hugo Arno Augustin, publicado no Diário Oficial de 30 de outubro (o próximo balanço mensal será a 30 deste mês), difícil entender. Mas o ministro Guido Mantega certamente terá condições de explicar. Afinal, dinheiro não nasce na relva dos parques paulistas no amanhecer. O orçamento federal situa-se na escala de 1 trilhão e 500 bilhões de reais.

Deste total, 1 trilhão e 298 bilhões são títulos em poder dos bancos que lastreiam a dívida interna. Existe apenas margem financeira aparente de 25 por cento. Os recursos destinados à Saúde são de apenas 48,4 bilhões. Está publicado naquela edição do DO. A rubrica Educação é atendida somente com 27,4 bilhões. Os pagamentos previstos em matéria de juros vão a 152,2 bilhões. Mas esta estimativa do diretor da STN foi feita antes da última elevação dos juros, de 13 para 13,75 por cento ao ano.

Com isso, em vez de 152,2 bilhões, o desembolso sobe para pouco mais de 160 bilhões de reais. Como existe disponibilidade para operações de socorro? Serão elas escriturais? Ou, como se diz agora depois da internet, virtuais? Dificilmente serão materiais. Alguma explicação lógica o fenômeno a que estou me referindo há de ter. Pois, fora da lógica, de fato, não existe nada na vida.

Nem se diga que os recursos salvadores estão nos 250 bilhões das cadernetas de poupança ou nos 200 bilhões de reais nas contas do FGTS. Nada disso. Estes dois valores, sem dúvida, já se encontram embutidos nos títulos que sustentam o giro da dívida interna do País de 1 trilhão e 298 bilhões. Basta considerar a diferença das taxas. As cadernetas rendem aproximadamente 0,6 por cento ao mês. As contas do FGTS estão na escala - podemos conferir pelos extratos que recebemos - de 0,45 por cento. Também ao mês. Os papéis federais são remunerados à base de 13,75 por cento ao ano.

Portanto, a uma velocidade de 1,1 por cento ao mês. Enfim, um mistério. Não somente brasileiro mas também americano, especialmente colocado na véspera de Barack Obama assumir a Casa Branca. Eu não sabia que existia tanto dinheiro disponível no mundo para salvar estabelecimentos de crédito. E tão pouco para assegurar a existência digna de bilhões de seres humanos. Há na comparação que faço um enigma a ser desvendado. Como fazê-lo?

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