BRUNO WILHELM SPECK
Um olhar sobre os países que lideram a lista e o grupo dos lanterninhas deixa bem claras as implicações da corrupção
EM SUA 12ª edição, o Índice de Percepções da Corrupção apresenta o Brasil em 72º lugar num total de 180 países avaliados. Na escala entre zero e dez, o país recebeu a nota 3,5, invertendo a queda que vinha sofrendo nos últimos anos. A coleta de dados para a nota deste ano se refere ao período entre janeiro de 2006 e julho de 2007. Desde o ano 2000, as notas vinham caindo de 3,9 para 3,3, no ano passado. Ainda é cedo para festejar a recuperação deste ano, pois ela está dentro da margem de erro da pesquisa.
Os resultados do IPCorr confirmam o retrato dos anos anteriores, em que o Brasil ocupava posição intermediária similar. Nessa mesma faixa estão outros países importantes, como a China, a Índia e o México.
Dentro da América Latina, destacam-se positivamente o Chile e o Uruguai (7,0 e 6,7, respectivamente). A Venezuela (2,0) e o Equador (2,1) receberam as piores avaliações na região.
Um olhar sobre os países que lideram a lista -como Suécia, Canadá e Suíça- e o grupo dos lanterninhas -incluindo Sudão, Afeganistão e Iraque- deixa bem claras as implicações da corrupção para o desenvolvimento político, econômico e social de qualquer país.
Percepções realmente são bastante subjetivas e podem distorcer a realidade. Mesmo assim, parece pouco aconselhável classificá-las como irrelevantes. O IPCorr revela um fator importante que influencia o comportamento dos agentes econômicos, nacionais e internacionais.
A avaliação de que num determinado país os negócios funcionam à base da propina tende a afastar investidores. Para ser mais exato: aqueles que apostam na competitividade se afastam, ao mesmo tempo em que outros, acostumados a trabalhar olhando a mão do poder público, são atraídos.
A atribuição de uma única nota a um país para descrever um fenômeno tão complexo como a corrupção -que envolve desde a propina ao guarda de trânsito até grandes escândalos envolvendo ministros e deputados- é um exercício simplificador.
E subsumir na mesma cifra as diferentes esferas de poder no Brasil, bem como realidades tão discrepantes entre União, Estados e mais de 5.000 municípios, parece ousadia demais.
Disso resulta que o índice não pode orientar sobre possíveis caminhos para reformas. Para fazer esses diagnósticos, temos à disposição levantamentos mais específicos.
Medições da corrupção servem a diferentes propósitos. O Índice de Percepções da Corrupção tem cumprido o seu papel de mobilizar a atenção internacional em torno de um tema relevante na atualidade. O lançamento do IPCorr acrescenta o tema da corrupção à agenda da mídia internacional e instiga a reflexão nacional sobre o tema.
A medição como instrumento de gestão requer ferramentas mais específicas. As experiências das organizações vinculadas à rede da Transparência Internacional abrangem pesquisas sobre a corrupção na prestação de serviços públicos, aplicadas em grande escala em países como Bangladesh, Quênia, Bulgária ou México.
Neste último, levantamentos entre cidadãos avaliam desde 2001 o pagamento de propina em relação a 35 serviços públicos prestados nos 32 Estados daquele país, acompanhando então a sua evolução a cada dois anos.
Levantamentos dessa envergadura servem tanto para diagnosticar problemas de corrupção em áreas específicas como para acompanhar sucessos e fracassos das políticas de combate à corrupção.
A estagnação do Brasil no IPCorr somente poderá ser revertida com políticas específicas de combate à corrupção, no âmbito de cada Poder, nos diferentes entes federativos.
Avanços em áreas específicas requerem uma forte atuação concentrada do poder público, do setor privado e da sociedade.
Pesa sobre o poder público a responsabilidade de tornar a engrenagem burocrática mais transparente e mais ágil, ao mesmo tempo em que deve fortalecer os processos de revisão e fiscalização.
O setor privado e a sociedade civil têm, além da obrigação de não recorrer ao suborno nos seus negócios com o Estado, um papel importante a cumprir. Devem apoiar aqueles setores da administração pública engajados em projetos de reforma e pressionar os representantes políticos a aprovar os projetos de reforma engavetados.
BRUNO WILHELM SPECK, 46, doutor em ciência política pela Universidade de Freiburg (Alemanha), é professor da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e assessor sênior da Transparência Internacional (organização internacional da sociedade civil de combate à corrupção) para a América Latina.
bspeck@transparency.org
Fonte: Folha Uol (para assinantes)
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz2609200708.htm